sexta-feira, janeiro 11, 2008

Amor pela terra

foto Peciscas
foto peciscas
foto Peciscas Nos meus 45 minutos (quase) diários de marcha pedestre, passo por pequenas hortas que se intercalam com espaços urbanos, maiores ou menores.
Entre elas, chama-me particularmente a atenção, uma que é cultivada por um casal de anciãos, que, faça sol ou frio ou chova, lá andam, à volta das verduras, das flores, do milho, das batatas. Com carinho e com esmero, apesar dos danos físicos com que o tempo já marcou aqueles corpos tisnados.
São um exemplo. Que demontra um apego à Natureza que está muito para lá das palavras profundas e bonitas que tantas vezes por aí ouvimos.
Este casal não quererá muito saber de férias, de subsídios. Não se preocupará com o Tratado de Lisboa ou com a contenção do défice ou com a localização do novo aeroporto.
Mas sabe o que é o amor à terra e à vida. E isso lhe basta.
Só que dou por mim a pensar que, em breve, o ciclo de vida deste casal de agricultores estará terminado. E, o mais certo é que aquele espaço verde , que, teimosamente, ainda resiste à voracidade da especulação imobiliária, vai ter o destino traçado.
Deixará de ser vivo e verde, para dar lugar ao betão.

quinta-feira, janeiro 10, 2008

Diversidade

Sou, decididamente, pela diversidade.
Penso que, na vida, há lugar para coisas muito diferentes, as quais podem coabitar pacificamente.
Por exemplo, tanto gosto de assistir a uma boa peça de teatro, como a um bom jogo de futebol.
Quanto a gostos musicais, já aqui vos confessei que tanto passo pelo fado, pela canção de autor, como pela música clássica. Brel,Sinatra, Pavarotti, Tordo,Camané, convivem, perfeitamente nas minhas preferências.
Na minha não muito larga roda de amigos, contam-se não só aqueles com quem se pode ter uma conversa mais aprofundada em termos culturais, como aqueles com quem se partilham umas larachas e se bebem uns copos.
Como também, já aqui tenho demonstrado, mesmo na blogosfera, as minhas viagens não têm um crivo selectivo muito estreito. Assim, tanto passo por locais onde há exigências de qualidade literária, onde se reflectem temas importantes, em termos sociais ou culturais, como frequento outros onde o pendor lúdico ou mais ligeiro são a norma.
E, mesmo os posts que por aqui passam, também não se inserem num registo único.
Textos, imagens, faixas sonoras, mais ou menos extensos, mais ou menos "sérios" mais ou menos "light", tudo aqui pode acontecer, fruto da disposição do momento que passa.
Há muitos anos, quando vivi em Timor, ao entrevistar a Amália, que por lá passou uns dias, pretendi saber por que incluia no seu reportório, autores tão diversos como Manuel Alegre, Camões e Mourão Ferreira, por um lado e Alberto Janes, por outro (autor de "A casa da Mariquinhas" e "Ouça lá ó Senhor Vinho"). E ela respondeu-me com alguma simplicidade:
-É que o Alberto Janes é como a papoila no campo de trigo.
E tinha razão a artista. Se as searas de trigo são essenciais, não menos importantes são os gritos de cor das garridas papoilas.
Pois, como se sabe, nem só de pão vive o Homem.

quarta-feira, janeiro 09, 2008

Não me apetece!

Poderia falar naquela história de já não haver o referendo que tinha sido prometido.
Mas não me apetece!
Quero lá saber!
Poderia peciscar sobre aquela coisa surrealista de se pagarem míseros aumentos a reformados, em prestações suaves.
Mas não me apetece.
Quero lá saber!
Poderia discorrer sobre a previsão de inflação anunciada para 2008 de 2,1%, que, nos primeiros dias de Janeiro já está a aparecer como 2,4%.
Mas não me apetece.
Quero lá saber!
Poderia escrever umas coisas sobre a Drª Fátima Campos Ferreira a expulsar da sala uns quantos cidadãos que se "estavam a portar mal" perante um ministro, nos Prós e Contras.
Mas não me apetece.
Quero lá saber!
Podia mesmo mandar uns bitaites sobre aquela edificante cena entre o Luisão e o Katsouranis.
Mas não me apetece.
Quero lá saber!
Não me apetece.
Quero lá saber!
Não sei se é por hoje estar cansado.
Mas já estou farto.
Quero lá saber!
Irra!
Quero lá saber!
Já não tenho pachorra!
Mesmo sabendo que dá muito jeito a alguns, haver cada vez mais gente a ficar farta de discutir, de protestar, de se incomodar.
A não querer saber!

terça-feira, janeiro 08, 2008

A falibilidade da Justiça

Um homem que estava preso no Texas desde 1981 foi agora libertado, depois de ter cumprido cerca de um terço da sentença de 99 anos a que foi condenado, por suposta agressão sexual.
Foram testes de ADN que demonstraram a sua inocência.
Por outro lado, desde 2001, 15 pessoas no condado de Dallas foram libertadas na sequência de testes deste tipo.
No Estado do Texas, há pelo menos 30 casos de condenação errada descobertos via ADN nos últimos sete anos.
O que demonstra, uma vez mais, a falibilidade da Justiça, que, sendo administrada por seres humanas, está sujeita a erros e preconceitos difíceis de evitar.
Pelo que a pena de morte, ainda existente em várias regiões do mundo e designadamente nos EUA, deveria, ela própria, estar definitivamente condenada à pena letal.
Mas há, ainda quem a defenda.
Tenho amigos (e certamente alguns visitantes deste espaço) que ainda não se deram conta da irracionalidade de uma tal medida, da qual nunca há retorno.
Injustificável em quaisquer circunstâncias.

segunda-feira, janeiro 07, 2008

A propósito de uma entrevista

Acabo de ouvir o Carlos do Carmo numa entrevista à Judite de Sousa e venho escrever este texto, que "irá para o ar" num destes dias.
Como já por aqui revelei, gosto de fado. Mas não é esse o motivo que traz aqui.
Nem sequer o facto de considerar este fadista como um homem sensível culto e inteligente.
O que me motivou estas breves linhas foi o facto de, durante a conversa com a jornalista, Carlos do Carmo ter revelado que o médico que o tratou, durante um dos seus graves problemas de saúde, o preveniu que um concerto, com a entrega que o artista lhe consagra, corresponde, em desgaste, a cinco dias úteis de trabalho. Cinco dias, entenda-se, em muitas outras profissões.
Quem me conhece melhor já está a antever o porquê de recuparar este passo da entrevista.
De facto, esta ideia peregrina e básica de se pretender igualizar as horas de trabalho das diversas profissões, pode colher alguns dividendos populistas em certas camadas da população, mas é de todo demagógica e injusta. Porque só se pode comparar... o que é comparável.
E, é claro, que vou puxar a brasa à minha sardinha.
Um professor, que faz da sua profissão aquele acto de entrega e de honestidade que a justifica, durante uma aula, mesmo que de 45 minutos (a maioria é, como se sabe, de 90), sofre um desgaste físico e psicológico que é seguramente equivalente ao esforço de bastante mais horas em outra actividade. Não esquecendo que aquela aula, tem atrás de si, todo um trabalho de preparação que a sustenta e tem depois de si, ainda, consequências.
Estar em constante estado de alerta (às reacções dos alunos, à sua participação, ao seu alheamento, à sua agressividade), permanecer em contínua adaptação às situações imprevistas, podem crer aqueles que nunca deram aulas : (porque os colegas sabem bem o que isso é), sai mesmo do corpo.
Do mesmo modo que uma actor não poderia estar diariamente seis horas em cima de um palco a representar, um futebolista não conseguiria estar quatro horas por dia em competição, há profissões sobre as quais não se podem ignorar as especificidades que lhe são imanentes.
Por muito que isso custe a quem parece fazer da tal igualitarismo acéfalo e fundamentalista, um ajuste de contas com certas classes profissionais.