sexta-feira, janeiro 26, 2007

Chico


Há muitos, muitos anos, pertencia eu à direcção de uma cooperativa cultural do Porto, quando recebemos um convite para assistirmos à representação de uma peça pelo TUCA - Teatro da Universidade Católica de S.Paulo.
Não sabíamos, ao certo o que era aquilo, mas lá fomos para o S.João, para vermos o espectáculo.
A nós, calhou-nos bilhete para a 2ª sessão.
À porta, esperando a vez de entrar, assistimos à saída do público da primeira sessão.
O Mestre António Pedro, um dos maiores nomes da nossa cultura, vinha com um olhar luminoso.E disse para um de nós, apenas:
-Que coisa bonita!
Passado pouco tempo, estávamos na sala, para assistirmos à encenação de um longo poema de João Cabral de Melo Neto: " Morte e Vida Severina".
O espectáculo começou, à boca de cena, com a dedicatória a um dos actores (todos eles estudantes) que tinha sido impedido de viajar para Portugal, pela ditadura militar que então imperava no Brasil.
Depois, foi o encantamento.
O cenário, quase inexistente, os figurinos lineares.
Mas o texto, narrando o drama dos povo nordestino desse grande país cheio de contrastes, era forte, dramático, intenso.
Grande parte, cantado.
Era impossível desviar por um segundo só a atenção do que se passava no palco.
No final, a ovação, irrompeu, poderosa, com toda a gente de pé, lágrimas, nos olhos. Durou, mais de quinze minutos.
Foi, seguramente, o espectáculo que mais senti em toda a minha vida.
No fim, de tudo, houve um colega que conseguiu ir aos bastidores e veio de lá com um pequeno disco (nessa altura de vinil), com as músicas principais da peça, autografado pelo respectivo autor.
O compositor era, ao tempo, ele também, um jovem estudante de Arquitectura de uma Universidade de S. Paulo.
Chamava-se Francisco Buarque de Hollanda, e nenhum de nós alguma vez tinha ouvido falar dele.
Mas haveríamos de ouvir falar muitas vezes dele, pela vida fora.
Dele, do Chico, das canções que ficarão para a história da música.
Não sei se esse colega ainda conserva o precioso vinil.
Se ainda o tem, vale ouro, certamente.


para ouvir, clicar no triângulo do player

quinta-feira, janeiro 25, 2007

Passei ao lado...

Nos meus tempos de juventude, convivi, mais ou menos de perto, com muita gente que é hoje bastante conhecida. "Figuras públicas" como se costuma dizer.
Alguns, estão na Assembleia da República. Por vezes após terem feito assinaláveis golpes de rins que os levaram a posições muito distantes das que inicialmente assumiam. Por exemplo, uma conhecida deputada, que hoje está no PSD mas que conheci a militar, ainda na clandestinidade, na então chamada UEC.
Outros estão na televisão como comentadores bem pagos.
Há mesmo alguma dessa gente que está ou esteve em cargos governamentais,autárquicos e outros.
Já aconteceu, uma ou outra vez, ter passado por perto de alguns desses conhecimentos antigos.Na maior parte dos casos, não se lembram ou fazem que não se lembram desses tempos em que me conheciam.
Esse pessoal, soube subir na vida. Aproveitou as oportunidades que lhes surgiram ou que procuraram. Para a maioria, o 25 de Abril foi a maior das oportunidades.Porque lhes permitiu valorizar uma real ou suposta participação na resistência ao anterior regime.
É claro que isso não foi nenhum crime; estavam no seu direito. Só que, às vezes, tendo em conta o que defendiam em certa altura da vida, e, também, o que demonstravam valer, dou por mim a pensar que, se calhar, passei ao lado de uma" grande carreira", por não ter sido "realista e pragmático" como eles.
Mas essa sensação vai-se embora imediatamente. Quando dou conta de que nunca seria capaz de me amoldar às circunvoluções que essas carreiras, quase sempre implicaram.
Por isso, não me lamento de continuar a ser um anónimo e modesto cidadão, que percorreu o caminho que escolheu, com a veleidade de não hipotecar os seus ideais às conveniências do momento.
Mas não deixo de esboçar um leve sorriso, quando vejo, a intervir publicamente, muitos desses cidadãos. É que, nessas alturas, nunca resisto à tentação de "rebobinar o filme".
E as coisas de que me lembro então!

terça-feira, janeiro 23, 2007

Ar de Paris...

Há muitas formas de apanhar dinheiro aos turistas.
Eu, pacóvio me confesso, comprei, há mais de quinze anos, esta adorável latinha que contém... ar de Paris em conserva.
Dada a composição daquele ar da "cidade-luz", que a própria embalagem refere, até hoje, nunca me arrisquei a abrir a dita lata.
foto Peciscas

segunda-feira, janeiro 22, 2007

Esquerda, direita?

Aos domingos, na Antena 1, Pedro Rolo Duarte, faz entrevistas a gente que tem blogues.
Pelos vistos, há uma pergunta que ele vai colocando aos entrevistados que lá vão:
- A ideia de blogue, é de esquerda ou de direita?
Acho esta pergunta, um espanto. De originalidade, de profundidade, de argúcia.
PRD, acrescenta à pergunta, que o que quer saber, se situa num plano puramente...filosófico.
Se formos nessa onda, então vamos assistir a uma corrente de perguntas deste tipo.
Assim, aos escritores, terá de se perguntar:
-A ideia de livro, é de esquerda ou de direita?
Aos cineastas:
-A ideia de cinema é de esquerda ou direita?
Aos jornalistas:
-A ideia de jornal, é de esquerda ou de direita?
Aos músicos:
- A ideia de disco é de esquerda ou de direita?
E por aí fora.
Para já, só ouvi uma resposta à profundíssima questão do PRD. E a entrevistada, lá se esforçou, o melhor que pôde, para dar uma resposta que nada dizia, mas que era tão somente, o resultado da boa educação, que manda não deixar sem reacção qualquer pergunta que nos façam.
Como se os instrumentos de comunicação, em si mesmos, pudessem ser de direita ou de esquerda, e não fossem as as perspectivas dos que deles se servem, a determinar a linha em que eventualmente se inserem.
Reforço aqui, o termo "eventualmente".
Porque isto de se afixar uma etiqueta que diga "esquerda" ou "direita",por vários motivos, começa a ter os dias contados.