sexta-feira, dezembro 28, 2007

Nos meus tempos de Timor, eu e os colegas que morávamos na casa que alugámos para escapar ao ambiente militar, fora das horas de serviço, resolvemos criar uma sala de estudo.
Mais para entreter do que para ganhar dinheiro.
Preparávamos, para exame de auto-propostos, adultos que queriam ampliar as suas qualificações académicas (para usar a designação agora em moda...).
De referir que os programas em vigor naquele território, como, aliás, nas restantes parcelas "ultramarinas" eram os programas criados para os alunos do então designado "Portugal Continental".
Assim, por exemplo, em Timor, os estudantes aprendiam as serras e rios do Minho ao Algarve, sem que fosse obrigatório referir um único rio ou uma serra timorense.
Até as linhas férreas tinham de conhecer quando, ali, nunca houve nem haveria, qualquer comboio...
Mas adiante...
O C. tinha a seu cargo as aulas de Inglês.
Certo dia, quando falava sobre peças de vestuário, ao chegar ao chapéu, disse algo como:
-My hat is black.
Reacção imediata das alunas (eram só mulheres): gargalhadas abafadas, cotoveladas umas nas outras e baixar de olhos.
E o colega, sem entender:
- Mas o que é que foi? Eu disse "My hat..."
Nova risada, agora mais franca e clara.
E o C. , por mais que insistisse, não conseguia entender o que se passava.
Até chegar à suspeita de que aquela expressão teria algum significado muito particular, em tétum, que era o dialecto local dominante.
Deste modo, depois de acabada a aula, veio falar comigo, perguntando-me se eu sabia o significado do som "My hat" em tétum.
Não sabia.
Mas o nosso empregado João, timorense, teria a resposta.
De modo que o fomos consultar.
-João, o que quer dizer "Mai het" (seria mais ou menos esta a grafia no dialecto)?
E o João, que era um homenzarrão, casado , com 6 filhos, fora os ameaços extra-conjugais. embaraçado, desviou o olhar.
Insistimos.
-João, diga lá o que é!
Só após a terceira tentativa, o bom do nosso amigo, de olhos pousados no chão disse, quase num susurro.
-Quer dizer "vem f...azer amor..." (é claro que o vocabulário português do João, era muito mais directo, sem recurso ao habitual eufemismo).
E pronto! Estava encontrada a explicação dos risinhos das alunas.
É caso para dizer: olha que o tétum também é uma língua muito traiçoeira!

quarta-feira, dezembro 26, 2007

Há coisas que não aceito



Há dias, cerca de meia centena de jornalistas e figuras da vida política e intelectual, pode visitar a Cartuxa de Évora, onde vivem doze monges, em reclusão total e quase em silêncio.
Esse acontecimento, foi considerado como excepcional, já que aqueles religiosos não querem ver perturbado o seu recolhimento.
No entanto, esta notícia, que apenas me despertou, inicialmente, uma breve curiosidade trazia, em nota marginal, um aspecto que me fez tocar campainhas de alarme.
É que, ao chegar à porta do convento, e de acordo com a reportagem, "o grupo foi obrigado a uma pequena cisão, já que os elementos femininos teriam de ficar à porta"." Se a entrada de um leigo na Cartuxa é já por si uma acto extraordinário, seria um colosso uma mulher franquear aqueles portões".
Assim mesmo.
Se o facto de uma comunidade se afastar do mundo é, no meu ponto de vista, um acto que denota algum egoísmo (pois, no fundo, é uma fuga à realidade que, a ser generalizada traria a paralisia da sociedade) a marginalização liminar e sem remissão, das mulheres, é algo que me surpreende ter sido tão placidamente acatada.
Pessoas, como António Barreto, Bagão Félix ou José Manuel Fernandes, tantas vezes a erguerem vozes pela igualdade de direitos das mulheres, aceitaram de bom grado que as suas companheiras de viagem ficassem à porta, em nome de uma visão doutrinária que ainda as considera como "tentações pecaminosas".
Sinceramente, há coisas que não entendo
Ou entendo, mas não aceito.

segunda-feira, dezembro 24, 2007