Leio, com alguma regularidade, a coluna semanal do António Barreto no "Público". Porque gosto de conhecer as diversas perspectivas dos chamados "fazedores de opinião". E, já agora, também porque fui contemporâneo do "Tommy" (diminutivo porque era conhecido) no então Liceu Nacional de Vila Real. Depois, deixei de o ver, até porque se refugiou na Suiça, para evitar a guerra colonial.
Mas, adiante.Consigo, em geral, estar de acordo com cerca de 30% daquilo que escreve. A margem restante tem a ver com uma série de ressábios que o António cultiva. Colocando-se, a maior parte das vezes, numa postura de distanciação superior, de detentor de uma verdade só ao alcance dos predestinados. Ou seja, este tipo de comentadores, normalmente bem pagos, considera que tem soluções infalíveis para tudo e para nada e que, sendo tão evidentes, só os néscios ou incompetentes não conseguem implementar.
Só que estes colunistas querem fazer esquecer que, muitas vezes, até estiverem em situações de poder fazer e não foram diferentes daqueles que agora criticam com alguma sobranceria. Por exemplo, parece que o A. Barreto já se esqueceu de que já foi governante. Será que ficou na história por ter conseguido ser o "herói ou o santo" de que fala na sua última crónica? Lembram-se quando ele, Ministro da Agricultura, produziu o notável conselho às mulheres prtuguesas para cozinharem com restos de comida porque "as nossas donas de casa são muito hábeis a aproveitar restos"?
No seu escrito do passado domingo, Barreto, a propósito da entrada em funções do novo governo, sem se comprometer com uma previsão sobre a qualidade do seu desempenho (estratégia também bastante utilizada pelos comentadores) vai desancando em tudo e todos os que têm passado pelos poder. Diz mesmo, a propósito da reforma da administração, que antes, todos falharam:Barroso, Guterres, Cavaco, Soares, Balsemão e Sá Carneiro. Não se salva nenhum. Salvar-se-ia Barreto, se tivesse sido 1º Ministro! Porque ele seria capaz!
Na mesma crónica, aconselha Sócrates a não "consolidar os regimes de privilégios de que beneficiam empreiteiros, magistrados, advogados, médicos e professores".
Aqui temos, impiedosamente denunciada, a classe de privilegiados que é responsável pela maioria dos males da nossa sociedade.
Descobri, assim, que integro a fatia desses privilegiados e, por isso, a partir de hoje, já não posso dormir sem sentimentos de culpa.
Sendo professor, sou um privilegiado. Porque integro uma categoria profissional em que milhares de elementos, têm, todos os anos, de esperar por uma colocação que, ou não chega, ou os obriga a andar com a casa às costas, vivendo em agregados familiares deconjuntados. Que têm de assinar o ponto de hora a hora. Que são alvo, a cada passo, de enxovalhos, de agressões, de humilhações à sua dignidade. Que veem, pouco a pouco, denegados direitos, pelo simples exercício do poder discricionário de superiores hierárquicos.
É conhecida a animosidade de alguns "fazedores de opinião" para com os professores. A. Barreto, é um deles. Na sua óptica a classe docente é uma cambada de relapsos, ignorantes e preguiçosos. Não deixa de ser, entretanto, curioso, referir que Barreto é (foi?) professor. Se calhar, quando fala dos males do ensino, só se quer referir ao Básico e Secundário... Normalmente, quem por aí aparece a falar, do alto da cátedra, dos problemas da Educação e respectivas soluções são pessoas que só têm (quando têm) experiência de docência universitária. Que tem (até ver) uma lógica completamente diferente da dos outros graus. É por isso que, estamos com um panorama educativo de estagnação ou até de retrocesso.Para se conseguir falar com algum acerto disto tudo, de propôr medidas que não sejam o reavivar de velhos dogmas falhados, no meu entender, é necessário respirar diariamente o pó do giz, enfrentar, dentro das quatro paredes de uma sala de aula, dezenas de jovens que não são retórica imaginária, mas sim a pura, nua e crua realidade. De um país, de uma juventude que desvaloriza a escola e a cultura. Para quem o aprender é uma estopada.
Mas, apesar disso tudo (ou, se calhar por isso tudo) sou um privilegiado. Pela parte que me toca, peço humildemente desculpa aos meus concidadãos!
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