sexta-feira, novembro 09, 2007

quarta-feira, novembro 07, 2007

O velho Spectrum


Em Abril deste ano, fez 25 anos que começou a ser comercializado na Inglaterra o Spectrum, que foi o mais famoso percursor dos modernos computadores pessoais.
Era uma máquina muito pequena e elegante, pouco mais do que um teclado.
Ligava-se a um mero aparelho receptor de televisão. Os programas e os jogos, eram carregados através de cassetes de fita magnética (usadas normalmente para gravações audio) com um simples leitor que se ligava ao computador.
Foi o primeiro computador que usei.
Aliás, a escola onde trabalhei em quase toda a minha vida profissional, foi uma das primeiras a adquirir uma destas máquinas.
Os meus conhecimentos sobre a informática eram, nessa altura, mais do que rudimentares. Mas nunca me esqueceu a "fórmula mágica" que fazia iniciar o Spectrum:
load, "" enter
Nessa altura, leccionava na minha escola, um colega de Inglês, cego (é este o termo que ele quer que se use para designar a sua falta de visão; "eu sou cego, não sou invisual" costuma dizer...)
Pois este professor, que é um homem reconhecidamente inteligente, sentiu, desde logo, que aquele utensílio poderia ser-lhe particularmente útil no seu trabalho docente, como forma de compensar as naturais dificuldades oriundas da sua deficiência física.
Assim, em breve, dominava já as potencialidades do micro-computador, sabendo programar e tudo.
Inclusivamente, construiu-me um software para leccionação de um conteúdo matemático que então se dava no 5º ano, que ficou espantosamente funcional. Eu só lhe expliquei o que queria e ele materializou a minha ideia em termos informáticos.
Aliás, este professor, tornou-se mesmo um especialista nesta área, tendo, designadamente, trabalhado muitos anos na DREN, como técnico informático, de onde foi obrigado a sair em tempos recentes.
No meu último ano de serviço, ainda trabalhei com este colega durante uns meses, numa disciplina chamada Estudo Acompanhado, leccionada, em simultâneo, por dois professores.
Pois o colega, dispõe de uma parafrenália de equipamentos informáticos e de projecção, incluindo teclados em braille, sintetizadores de voz que lhe permitem "ler" frases que estão escritas no monitor e por aí fora.
Quantas vezes, ao ajudá-lo, no fim das aulas, a guardar todo esse material, não recordámos aqueles tempos heróicos do velho Spectrum, que, apesar de hoje parecer um simples brinquedo, veio dar um gigantesco passo no caminho do progresso, em muitos sectores da nossa vida.

terça-feira, novembro 06, 2007

Brandos costumes ?

Normalmente, resisto à tentação de peciscar a quente sobre assuntos que a comunicação social nos vai trazendo, de forma mais ou menos dramatizada.
Prefiro deixar passar alguns dias, procurar recolher mais dados e decidir se vale mesmo a pena falar de coisas sobre as quais já tanta gente falou.

Uma dessas notícias, e sobre a qual tenho mesmo de falar, revelou-nos um abjecto crime de que foi vítima um indivíduo, em Borralheira de Orjais, perto da Covilhã, que foi atado a uma grade, encharcado em álcool e deixado à sua sorte, que não foi nenhuma. Morreu asfixiado, enregelado, intoxicado.
Passado um dia ou dois, o JN foi fazer uma reportagem à aldeia.
Aí vimos os pais do assassinado, a viver numa casa degradada, com parcos rendimentos e com uma resignada conformação perante o desaparecimento do filho, que era a trave essencial da sua sobrevivência.
Pelos vistos, a vítima era pessoa que facilmente cedia à tentação da bebida, e nessas circunstâncias, tornava-se uma espécie de bobo da aldeia.
Mas aquilo que mais me gelou na reportagem, foi a constatação do facto de, nesta terra, grande parte da população considerar que os rapazolas, também eles com "copos a mais", que cometeram o hediondo acto, "apenas" deveriam ter mais cuidado e não deixarem o homem só, depois de acabada a "brincadeira".
Ou seja, esses cidadãos consideravam perfeitamente normal, que se dispusesse do corpo de um homem, para se divertirem a seu belo prazer. Isso, em si, "não teria nada de mal". Eles próprios já tinham assistido, com gozo, a cenas similares.

Há uns anos, veio também nos jornais, a história de um aprendiz de mecânico a quem colegas mais velhos da oficina, injectaram ar nos intestinos com uma bomba de encher pneus, causando-lhe lesões gravíssimas, não sei mesmo se fatais.
Também "por brincadeira".
E muitos mais casos análogos se poderiam citar.

É perante este tipo de reacções e de mentalidades que eu tenho de considerar que essa história de se dizer que somos um "povo de brandos costumes" é uma ficção.
Somos, provavelmente, em grande medida, um povo que, muitas vezes, se acobarda e se conforma e por isso "deixa andar".
Mas basta que os contextos criem a oportunidade, que o grupo se empolgue, que a bebida liberte, e lá teremos um bando de compatriotas a humilhar, a achincalhar, a gargalhar boçalmente, a descarregar frustrações acumuladas, perante os mais fracos, os mais indefesos, os mais vulneráveis.

Brandos costumes?
Uma ova!

segunda-feira, novembro 05, 2007

Fábricas de sonhos...

Passando pelos corredores de um centro comercial da zona onde moro, deparei-me com uma espécie de estúdio fotográfico e uns painéis com fotografias de rapazes e raparigas muito jovens.
Atentando melhor naquilo, constatei, estupefacto, que se tratava de um convite para que crianças e adolescentes entre os 5 (!) e os 15 anos, se deixassem fotografar, tendo em vista um casting que as poderia fazer iniciar uma carreira de "jovem modelo/actor".

É claro que, tudo leva a crer que o objectivo fundamental seria o de levar os progenitores das crianças, a desembolsarem alguns euros para pagamentos das ditas fotografias e sabe-se lá o que mais.
Reparei, entretanto, que algumas das fotografias afixadas (com o nome e tudo) mostravam crianças que, pelo seu aspecto físico, muito dificilmente poderiam aspirar a uma carreira do tipo das propagandeadas, tendo em conta os cânones que as indústrias da moda e do espectáculo costumam exigir.
Fiquei banzado e a pensar que, se calhar, afinal, eu é que já não estou bem enquadrado no tempo em que vivemos.
Então, anda-se por aí a falar, um pouco por todo lado, em exploração do trabalho infantil, em anorexias e bulimias, em criação de ilusões que podem conduzir a frustrações depressivas complicadas ou mesmo à exposição a aproveitamentos inconfessáveis por parte de gente sem escrúpulos, e permite-se que circulem estas "fábricas de sonhos" completamente enganosas?

E o que é mais preocupante é que lá estavam mamãs, com as suas filhas e filhos, a preencherem os papéis e a marcarem vez para a fotografia.
No fundo, estes comércios, vão-se aproveitar da tendência que muitos pais vão tendo, em fazerem dos filhos os depositários das esperanças e anseios que nunca conseguiram concretizar.
Mas, ao embarcarem nestes perigosos comboios, nem se quer se dão conta do perigo de estarem a iniciar um complexo processo de agregação dos filhos a expectativas irrealizáveis que os poderá levar a caminhos nada recomendáveis.
Depois, quando um dia as situações inesperadas acontecem, pode já ser muito complicado remediar o erro...